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Hall da Fama: Mês de Junho

29 de jun. de 2014

Eu tenho diversas preferências e favoritos, seja no mundo cinematográfico, na literatura ou na música. Por esse motivo resolvi criar essa coluna, chamada Hall da Fama, onde uma vez por mês trago um destaque para vocês, com curiosidades e indicações. Fiquei em dúvida com quem começar, pois como disse, eu tenho muitos favoritos por aí. Entretanto, eu tinha que escolher essa pessoa porque foi com ele que eu criei paixão pela literatura. Se não fosse por esse homem, acredito que hoje não teria a metade da vontade de ler ou de escrever. O Hall da Fama do mês de junho é seu, José de Alencar.

Eu nasci em uma família de escritores. Está no meu sangue. Cresci rodeada por livros e mais livros. Lembro que um dos meus lugares favoritos era a biblioteca do meu avô – que possui o dom da escrita como ninguém. Minha mãe também cultivava um grande acervo de livros na nossa casa. Eu aprendi a ler e escrever sozinha, e quando dominava a leitura – depois de me entediar com livros com gravuras e enredo infantil -, fui me aventurando nos livros da minha mãe e do meu avô. Confesso que ficava horas tirando todos os livros fora da prateleira, admirando as capas. As letras miúdas e páginas amarelas não me intimidavam nem um pouco. Um deles me chamou a atenção. Era Lucíola, de José de Alencar. Devorei o livro em menos de dois dias e me encantei. A partir daí, roubei todos os livros desse tal José e os deixei no meu quarto, bem próximo a mim. Mas quem foi José e o que ele fez, Renas?

O escritor brasileiro José de Alencar nasceu no Ceará, região nordeste do Brasil, no ano de 1829. Filho de José Martiniano de Alencar e Ana Josefina de Alencar, o jovem foi influenciado pelos ideais políticos do pai, senador, assim como o irmão, diplomata. Formado em direito, o escritor atuou como advogado, jornalista, dramaturgo e até como político. A primeira obra, “Cinco Minutos”, foi lançada em 1856. A segunda, “A Viuvinha”, foi publicado no ano seguinte. “O Guarani”, obra mais famosa de José de Alencar, data do mesmo ano. Nas suas obras, Alencar demonstra uma preocupação com a cultura nacional. Buscando retratar o Brasil através de diferentes temáticas: indianistas, regionalistas, históricas e urbanas.  Sendo a primeira figura das nossas letras, foi chamado “o patriarca da literatura brasileira”. Faleceu no Rio de Janeiro, de tuberculose, aos 48 anos de idade.

Acredito que toda a minha paixão por literatura, dramaturgia e sonoridade romancista tenha raízes com a minha admiração pelo trabalho de José de Alencar, também conhecido como o fundador do romantismo brasileiro. Quem já leu sabe que se quiser falar de amor, fale com o Marcinho José.

José de Alencar adora criticar a realidade (na sua época) do Brasil através do seu romance. Apesar de se espelhar no modelo europeu, sua escrita é totalmente nacionalista. Essa é a sua principal característica. Contudo, o seu romance não é melodramático como Álvares de Azevedo, ele é duro, consistente e real. É possível notar toque de crueldade e sarcasmo nos seus protagonistas, especialmente as mulheres dos seus romances históricos e urbanos. Particularmente, acredito que José de Alencar tenha sido um feminista por deixar no ar uma motivação por meio das mulheres de não submissão. Alencar acreditava sinceramente na vitória do homem na reforma de si mesmo e da sociedade.


Principais obras (e minhas favoritas)



Senhora (1875)
É o meu romance preferido na história mundial desse universo. Eu amo tanto esse livro que já o li umas dez vezes e sempre, sempre termino com um ar de “Meu Deus, José, você é foda!”. Trata do tema do casamento burguês, ou seja, baseado no interesse financeirovivenciado em meados do Segundo Reinado, na cidade de Rio de Janeiro. Nossa protagonista é Aurélia, uma jovem mulher dividida entre o amor e o ódio, o desejo e o desprezo pelo homem que ama. É um romance dividido em quatro partes e não obedece uma ordem cronológica. De início somos introduzidos a trama onde Aurélia compra seu marido, Fernando, sem que este saiba sua identidade, apenas o preço exorbitante que receberá se aceitar. Como se encontrava em péssimas condições financeiras, Fernando aceita e na noite de núpcias descobre que sua nova mulher é Aurélia, a moça por quem fora apaixonado anos antes, mas que rechaçara por não ser rica. A partir de então começamos a entender o porquê de Aurélia tê-lo comprado e como os dois vão levar a vida nesse casamento comprado. Eu DEVO dizer que Aurélia é a heroína romântica mais diva de qualquer livro já escrito. Ela é cruel, mordaz e com uma sede de vingança invejável. Já li em muitas resenhas onde tratam a Aurélia como bipolar por amar e odiar Fernando. Eu discordo completamente. Ela é apenas uma mulher com coração partido e com o orgulho maior que a cabeça. Aurélia nunca sai do salto e a maneira como trata Fernando é digna de admiração. Eu queria ser como ela, às vezes. 




Tentei achar a mesma capa do livro
 que tenho, não achei :(
Lucíola (1862)

Paulo Silva é um rapaz de 25 anos, pernambucano, recém-chegado ao Rio de Janeiro com a intenção de aí se estabelecer. No dia mesmo de sua chegada à corte sai em companhia de um amigo para conhecer a cidade e vê passar em um carro uma jovem muito bela. Descobre que é Lúcia, a cortesã mais requintada e desejada da cidade. E se apaixona por ela. O núcleo central da história se concentra em Paulo e Lúcia, mostrando suas individualidades com passado e presente próprios e também a luta como o par romântico. É muito parecido com Senhora no lance da luta entre necessidade financeira e os apelos do coração, tendo como antagonista a sociedade e seus hábitos doentios e seus costumes imorais. É aquela coisa de trocar o que sente pelo o que precisa. A melhor forma de resumir Lucíola é assistindo ao filme Moulin Rouge, a premissa é a mesma e a coincidência nos fatos é nítida. Eu não gosto tanto de Lucíola como gosto de Aurélia, acho a primeira bem mais cínica e que brinca com os sentimentos de Paulo.




Iracema (1865)

A história de Pocahontas. Sem brincadeira, é isso mesmo. O romance indianista mais conhecido da literatura brasileira. A leitura obrigatória do ensino médio e para provas de vestibulares. No romance há um argumento histórico: a colonização do Ceará. Nele há a presença de personagens históricos: Martim Soares Moreno, o colonizador português que se aliou aos índios Pitiguaras e Poti, Antônio Felipe Camarão. Basicamente o livro é sobre o amor de Martim, o colonizador, por Iracema, a colonizada, e todas as barreiras que devem enfrentar para ficarem juntos. Iracema perde o posto de virgem intocável ao se relacionar com Martim e se entregar e esse amor, e Martim se vê no dilema de amar uma selvagem e ser fiel aos seus ideais brancos. Alencar mostra uma conciliação do branco com o índio na representação da colonização do Brasil. Eu gosto desse livro por seu enredo indianista, mas eu ODEIO a Iracema, acho ela insuportável e dramática além do ponto.




A Pata da Gazela (1870)

Baseado em A Cinderela, Alencar aproveita o enredo, no qual uma jovem, ao entrar apressada dentro de uma carruagem, perde um par de seu sapato, que é encontrado por um rapaz que sai à procura da dona. Só que Alencar continua essa história de uma maneira irônica e linda de se ler. Amelia perde o sapato e Leopoldo, herói rico, o encontra. Horácio, herói pobre, também se apaixona por Amelia e assim vivenciamos um triangulo amoroso. A gente nunca sabe quem a Amelia vai escolher até o final do livro. Eu torço por Horácio, acho que todo mundo torce por ele ter desvantagem em relação a Leopoldo que é rico e sabe da ‘arte da sedução’. Como de praxe do romance alencariano, há muitas reviravoltas, mal entendidos e uma mocinha que se deixa levar por tudo que ouve ou parece ter ouvido. É um livro interessante de se ler porque a gente – especialmente as meninas – crescemos ouvindo a história da Cinderella e seu príncipe encantado perfeito e José quis jogar um balde de água fria nessa nossa idealização. E conseguiu, de certa maneira.


Outras obras de Alencar
- A viuvinha (1860);
- Diva (1864);
- O Guarani (1857);
- Ubirajara (1874);
- O gaúcho (1870);
- O tronco do ipê (1871);
- O sertanejo (1875).



Esse é o homem por quem eu sou apaixonada desde pequenininha. José de Alencar capturou meu coração e fez dele sua moradia com seu romantismo cruel e avassalador. Espero que eu consiga despertar um pouco a curiosidade e vontade de vocês de ler um pouco sobre esse homem e suas obras. Acho que a gente desvaloriza muito a nossa própria cultura. Vejo por aí um monte de crianças lendo literatura estrangeira - o que é válido, claro, pelo menos estão lendo - e não sabem citar um autor daqui. E mais, a literatura antiga e sua linguagem pode tirar a vontade por ser mais difícil, mas a sua essência é magnífica. Sou mais do que a favor de leitura obrigatória de clássicos brasileiros nas escolas, acho primordial pra educação de base de qualquer pessoa.

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