Eu tenho diversas preferências e favoritos, seja no
mundo cinematográfico, na literatura ou na música. Por esse motivo resolvi
criar essa coluna, chamada Hall da Fama, onde uma vez por mês trago um destaque
para vocês, com curiosidades e indicações. Fiquei em dúvida com quem começar,
pois como disse, eu tenho muitos favoritos por aí. Entretanto, eu tinha que
escolher essa pessoa porque foi com ele que eu criei paixão pela literatura. Se
não fosse por esse homem, acredito que hoje não teria a metade da vontade de
ler ou de escrever. O Hall da Fama do mês de junho é seu, José de Alencar.
Eu nasci em uma família de escritores. Está no meu
sangue. Cresci rodeada por livros e mais livros. Lembro que um dos meus lugares
favoritos era a biblioteca do meu avô – que possui o dom da escrita como
ninguém. Minha mãe também cultivava um grande acervo de livros na nossa casa.
Eu aprendi a ler e escrever sozinha, e quando dominava a leitura – depois de me
entediar com livros com gravuras e enredo infantil -, fui me aventurando nos
livros da minha mãe e do meu avô. Confesso que ficava horas tirando todos os
livros fora da prateleira, admirando as capas. As letras miúdas e páginas
amarelas não me intimidavam nem um pouco. Um deles me chamou a atenção. Era
Lucíola, de José de Alencar. Devorei o livro em menos de dois dias e me encantei.
A partir daí, roubei todos os livros desse tal José e os deixei no meu quarto,
bem próximo a mim. Mas quem foi José e o que ele fez, Renas?
O escritor brasileiro José de Alencar nasceu no Ceará, região nordeste do Brasil, no ano de 1829. Filho de José Martiniano de Alencar e Ana Josefina de Alencar, o jovem foi influenciado pelos ideais políticos do pai, senador, assim como o irmão, diplomata. Formado em direito, o escritor atuou como advogado, jornalista, dramaturgo e até como político. A primeira obra, “Cinco Minutos”, foi lançada em 1856. A segunda, “A Viuvinha”, foi publicado no ano seguinte. “O Guarani”, obra mais famosa de José de Alencar, data do mesmo ano. Nas suas obras, Alencar demonstra uma preocupação com a cultura nacional. Buscando retratar o Brasil através de diferentes temáticas: indianistas, regionalistas, históricas e urbanas. Sendo a primeira figura das nossas letras, foi chamado “o patriarca da literatura brasileira”. Faleceu no Rio de Janeiro, de tuberculose, aos 48 anos de idade.
Acredito que toda a minha paixão por literatura, dramaturgia e
sonoridade romancista tenha raízes com a minha admiração pelo trabalho de José
de Alencar, também conhecido como o fundador do romantismo brasileiro. Quem já
leu sabe que se quiser falar de amor, fale com o Marcinho José.
José de Alencar adora criticar a realidade (na sua
época) do Brasil através do seu romance. Apesar de se espelhar no modelo
europeu, sua escrita é totalmente nacionalista. Essa é a sua principal
característica. Contudo, o seu romance não é melodramático como Álvares de
Azevedo, ele é duro, consistente e real. É possível notar toque de crueldade e
sarcasmo nos seus protagonistas, especialmente as mulheres dos seus romances
históricos e urbanos. Particularmente, acredito que José de Alencar tenha sido
um feminista por deixar no ar uma motivação por meio das mulheres de não
submissão. Alencar acreditava sinceramente na vitória do homem
na reforma de si mesmo e da sociedade.
Principais obras (e minhas favoritas)
Senhora (1875)
É o meu romance preferido na história mundial desse
universo. Eu amo tanto esse livro que já o li umas dez vezes e sempre, sempre
termino com um ar de “Meu Deus, José, você é foda!”. Trata
do tema do casamento burguês, ou seja, baseado no interesse financeiro, vivenciado
em meados do Segundo Reinado, na cidade de Rio de Janeiro. Nossa protagonista é
Aurélia, uma jovem mulher dividida entre o amor e o ódio, o desejo e o desprezo
pelo homem que ama. É um romance dividido em quatro partes e não obedece uma ordem
cronológica. De início somos introduzidos a trama onde Aurélia compra
seu marido, Fernando, sem que este saiba sua identidade, apenas o preço exorbitante
que receberá se aceitar. Como se encontrava em péssimas condições financeiras,
Fernando aceita e na noite de núpcias descobre que sua nova mulher é Aurélia, a
moça por quem fora apaixonado anos antes, mas que rechaçara por não ser rica. A
partir de então começamos a entender o porquê de Aurélia tê-lo comprado e como
os dois vão levar a vida nesse casamento comprado. Eu DEVO dizer que Aurélia é
a heroína romântica mais diva de qualquer livro já escrito. Ela é cruel, mordaz
e com uma sede de vingança invejável. Já li em muitas resenhas onde tratam a
Aurélia como bipolar por amar e odiar Fernando. Eu discordo completamente. Ela
é apenas uma mulher com coração partido e com o orgulho maior que a cabeça.
Aurélia nunca sai do salto e a maneira como trata Fernando é digna de
admiração. Eu queria ser como ela, às vezes. Tentei achar a mesma capa do livro que tenho, não achei :( |
Lucíola
(1862)
Paulo
Silva é um rapaz de 25 anos, pernambucano, recém-chegado ao Rio de Janeiro com
a intenção de aí se estabelecer. No dia
mesmo de sua chegada à corte sai em companhia de um amigo para conhecer a
cidade e vê passar em um carro uma jovem muito bela. Descobre
que é Lúcia, a cortesã mais requintada e desejada da cidade. E se apaixona por
ela. O núcleo central da história se concentra em Paulo e Lúcia, mostrando suas
individualidades com passado e presente próprios e também a luta como o par
romântico. É muito
parecido com Senhora no lance da luta entre necessidade financeira e os apelos
do coração, tendo
como antagonista a sociedade e seus hábitos doentios e seus costumes imorais. É aquela
coisa de trocar o que sente pelo o que precisa. A melhor forma de resumir
Lucíola é assistindo ao filme Moulin Rouge, a premissa é a mesma e a
coincidência nos fatos é nítida. Eu não gosto tanto de Lucíola como gosto de
Aurélia, acho a primeira bem mais cínica e que brinca com os sentimentos de Paulo.
Iracema
(1865)
A
história de Pocahontas. Sem brincadeira, é isso mesmo. O romance indianista
mais conhecido da literatura brasileira. A leitura obrigatória do ensino médio
e para provas de vestibulares. No romance há um argumento histórico: a
colonização do Ceará. Nele há a presença de personagens históricos: Martim
Soares Moreno, o colonizador português que se aliou aos índios Pitiguaras e
Poti, Antônio Felipe Camarão. Basicamente
o livro é sobre o amor de Martim, o colonizador, por Iracema, a colonizada, e
todas as barreiras que devem enfrentar para ficarem juntos. Iracema perde o
posto de virgem intocável ao se relacionar com Martim e se entregar e esse
amor, e Martim se vê no dilema de amar uma selvagem e ser fiel aos seus ideais
brancos. Alencar mostra uma conciliação do branco com o índio na representação
da colonização do Brasil. Eu gosto desse livro por seu enredo indianista, mas eu
ODEIO a Iracema, acho ela insuportável e dramática além do ponto.
A Pata da
Gazela (1870)
Baseado em A Cinderela, Alencar aproveita o enredo, no qual uma jovem, ao entrar
apressada dentro de uma carruagem, perde um par de seu sapato, que é encontrado
por um rapaz que sai à procura da dona. Só
que Alencar continua essa história de uma maneira irônica e linda de se ler.
Amelia perde o sapato e Leopoldo, herói rico, o encontra. Horácio, herói pobre,
também se apaixona por Amelia e assim vivenciamos um triangulo amoroso. A gente
nunca sabe quem a Amelia vai escolher até o final do livro. Eu torço por
Horácio, acho que todo mundo torce por ele ter desvantagem em relação a
Leopoldo que é rico e sabe da ‘arte da sedução’. Como de praxe do romance
alencariano, há muitas reviravoltas, mal entendidos e uma mocinha que se deixa
levar por tudo que ouve ou parece ter ouvido. É um livro interessante de se ler
porque a gente – especialmente as meninas – crescemos ouvindo a história da
Cinderella e seu príncipe encantado perfeito e José quis jogar um balde de água
fria nessa nossa idealização. E conseguiu, de certa maneira.
Outras obras de Alencar
- A viuvinha (1860);
- Diva (1864);
- Diva (1864);
- O Guarani (1857);
- Ubirajara (1874);
- Ubirajara (1874);
- O gaúcho (1870);
- O tronco do ipê (1871);
- O sertanejo (1875).
- O tronco do ipê (1871);
- O sertanejo (1875).
Esse é o homem por quem eu sou apaixonada desde pequenininha. José de
Alencar capturou meu coração e fez dele sua moradia com seu romantismo cruel e
avassalador. Espero que eu consiga despertar um pouco a curiosidade e vontade
de vocês de ler um pouco sobre esse homem e suas obras. Acho que a gente
desvaloriza muito a nossa própria cultura. Vejo por aí um monte de crianças
lendo literatura estrangeira - o que é válido, claro, pelo menos estão lendo -
e não sabem citar um autor daqui. E mais, a literatura antiga e sua linguagem
pode tirar a vontade por ser mais difícil, mas a sua essência é magnífica. Sou
mais do que a favor de leitura obrigatória de clássicos brasileiros nas
escolas, acho primordial pra educação de base de qualquer pessoa.